terça-feira, 30 de agosto de 2011

Não me espere, porque eu não volto logo

Tudo bem. Eu estava ótima semana passada, com a cabeça nas nuvens e os pensamentos longe daqui. Mas felicidade deixa rastro e você seguiu o meu. Logo te encontrei parado na soleira da minha porta com a mesma cara de assustado de anos atrás.
Nós ficamos horas conversando e meu monólogo sem fim sobre a turbulenta vida que ando levando parecia aborrecer você.
O muro e suas unhas comidas pareciam mais interessantes a medida que a noite caia e você era incapaz de me encarar nos olhos. 
Eu queria ter sentido o coração acelerar e ter ouvido os sininhos de fundo quando você me beijou, mas não aconteceu, e é tão triste assistir um amor tão bonito como o nosso morrer assim, em plena segunda-feira.


Não tá doendo mais. Porém as lágrimas ainda não pararam de rolar. Eu gosto de te ter por perto, mesmo que seja da maneira como foi ontem, mesmo que nós dois saiamos feridos dessa história mais uma vez, que saiamos feridos todas as vezes que isso insistir em se repetir, meu lado masoquista fala alto quando o assunto é você e eu não me importo de me despedir sangrando.
Nós já discursamos as mesmas coisas tantas vezes que nossa conversa é automática, sempre falando dos mesmos assuntos, mesmas pessoas, mesmas brigas. Mas o desfecho da noite anterior foi diferente, porque dessa vez não fui eu quem saiu com o coração partido.
Me matou te ver sair correndo pelas ruas soturnas da madrugada com o rosto molhado e o coração na mão. Meu desejo foi te trancar numa caixinha pra te guardar do mundo lá fora e enrolar seus cabelos até você pegar no sono.
Você é confuso e sempre aparece nas piores horas, da pior maneira e como um vendaval espalha tudo o que eu demorei tanto tempo pra arrumar. Bagunça minhas memórias e traz a tona o meu passado que eu escondi no mais profundo âmago.
Por mais que queiramos que as coisas tivessem tomado outro rumo, por mais que desejemos que fosse diferente, o que passou não vai mudar.
Você sabe que nosso final feliz utópico não existe, é melhor nos contentarmos com os finais substitutos e sermos felizes da nossa maneira.
Nesse momento controlo o impulso de invadir sua casa e, com uma mochila nas costas, sumir com você pela América Central.
De qualquer modo, é melhor aprendermos com a música que 'cantamos' ontem 'Vá voar com o tempo que só lá você existe, não esqueça que eu não sei mais nada de você' ♫


Só te peço que não fique triste se eu parecer distante, eu nunca soube mesmo o que é bom pra mim e talvez agora eu tenha percebido que estar envolvida no seu mundo não me faz tão bem assim, porque esse amor me quebra e você já desperdiçou a melhor parte de mim.
Apesar de tudo, amanhã é um novo dia e você pode vir matar algum tempo, você pode jogar seus braços em volta de mim e continuar me fazendo rir da maneira que só você consegue.






Sou alvo dos seus olhos claros parecidos com essa estação, e adoro os efeitos sonoros de quando você sussurra absurdos no ouvido do meu coração.

Namore uma garota que lê

Namore uma garota que gasta seu dinheiro em livros, em vez de roupas. Ela também tem problemas com o espaço do armário, mas é só porque tem livros demais. Namore uma garota que tem uma lista de livros que quer ler e que possui seu cartão de biblioteca desde os doze anos.
Encontre uma garota que lê. Você sabe que ela lê porque ela sempre vai ter um livro não lido na bolsa. Ela é aquela que olha amorosamente para as prateleiras da livraria, a única que surta (ainda que em silêncio) quando encontra o livro que quer. Você está vendo uma garota estranha cheirar as páginas de um livro antigo em um sebo? Essa é a leitora. Nunca resiste a cheirar as páginas, especialmente quando ficaram amarelas.

Ela é a garota que lê enquanto espera em um Café na rua. Se você espiar sua xícara, verá que a espuma do leite ainda flutua por sobre a bebida, porque ela está absorta. Perdida em um mundo criador pelo autor. Sente-se. Se quiser ela pode vê-lo de relance, porque a maior parte das garotas que leem não gostam de ser interrompidas. Pergunte se ela está gostando do livro.

Compre para ela outra xícara de café.
Diga o que realmente pensa sobre o Murakami. Descubra se ela foi além do primeiro capítulo da Irmandade. Entenda que, se ela diz que compreendeu o Ulisses de James Joyce, é só para parecer inteligente. Pergunte se ela gosta ou gostaria de ser a Alice.
É fácil namorar uma garota que lê. Ofereça livros no aniversário dela, no Natal e em comemorações de namoro. Ofereça o dom das palavras na poesia, na música. Ofereça Neruda, Sexton Pound, cummings. Deixe que ela saiba que você entende que as palavras são amor. Entenda que ela sabe a diferença entre os livros e a realidade mas, juro por Deus, ela vai tentar fazer com que a vida se pareça um pouco como seu livro favorito. E se ela conseguir não será por sua causa.

É que ela tem que arriscar, de alguma forma.
Minta. Se ela compreender sintaxe, vai perceber a sua necessidade de mentir. Por trás das palavras existem outras coisas: motivação, valor, nuance, diálogo. E isto nunca será o fim do mundo.

Trate de desiludi-la. Porque uma garota que lê sabe que o fracasso leva sempre ao clímax. Essas garotas sabem que todas as coisas chegam ao fim. E que sempre se pode escrever uma continuação. E que você pode começar outra vez e de novo, e continuar a ser o herói. E que na vida é preciso haver um vilão ou dois.

Por que ter medo de tudo o que você não é? As garotas que leem sabem que as pessoas, tal como as personagens, evoluem. Exceto as da série Crepúsculo.

Se você encontrar uma garota que leia, é melhor mantê-la por perto. Quando encontrá-la acordada às duas da manhã, chorando e apertando um livro contra o peito, prepare uma xícara de chá e abrace-a. Você pode perdê-la por um par de horas, mas ela sempre vai voltar para você. E falará como se as personagens do livro fossem reais – até porque, durante algum tempo, são mesmo.
Você tem de se declarar a ela em um balão de ar quente. Ou durante um show de rock. Ou, casualmente, na próxima vez que ela estiver doente. Ou pelo Skype.
Você vai sorrir tanto que acabará por se perguntar por que é que o seu coração ainda não explodiu e espalhou sangue por todo o peito. Vocês escreverão a história das suas vidas, terão crianças com nomes estranhos e gostos mais estranhos ainda. Ela vai apresentar os seus filhos ao Gato do Chapéu [Cat in the Hat] e a Aslam, talvez no mesmo dia. Vão atravessar juntos os invernos de suas velhices, e ela recitará Keats, num sussurro, enquanto você sacode a neve das botas.

Namore uma garota que lê porque você merece. Merece uma garota que pode te dar a vida mais colorida que você puder imaginar. Se você só puder oferecer-lhe monotonia, horas requentadas e propostas meia-boca, então estará melhor sozinho. Mas se quiser o mundo, e outros mundos além, namore uma garota que lê.

Ou, melhor ainda, namore uma garota que escreve.

Rosemary Urquico- Date a girl who reads 

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Com tanto potencial pra acabar com a minha vida, sabe o que ele quer? Me fazer feliz. Olha que desgraça. O moço quer me fazer feliz. Veja se pode. Não dá, assim não dá. Deveria ter cadeia pra esse tipo de elemento daninho. Pior é que vicia. Não é que acordei me achando hoje? Agora neguinho me trata mal e eu não deixo. Agora neguinho quer me judiar e eu mando pastar. Dei de achar que mereço ser amada. Veja se pode. Chega um desavisado com a coxa mais incrível do país e muda tudo. Até assoviando eu tô agora.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Eu preciso saber

A recaída de amor acontece como num daqueles pesadelos que se está caindo. De repente você acorda sentado na cama: Meu Deus, eu preciso saber! Mas se eu já estava tão bem há semanas. Volte a dormir, volte a dormir. Você já tinha decidido lembra? Nada a ver com você, chato, bobo, não deu certo. Mas eu preciso saber. Não, não precisa. Pra quê? Vai te machucar. Não! Eu preciso saber. Então levanto da cama.

Facebook, a desgraça em formato de parquinho virtual. Nome dele, aparece a foto azulada e ele de perfil. É tão bonito. Mas não há mais nada que eu possa ver. Nos deletamos mutuamente pra evitar justamente esse tipo de inspecão noturna.
Mas isso não vai ficar assim. Ligo pra nossa amiga em comum. Ela não atende, afinal, são duas da manhã. Mando mensagem "me manda sua senha do Facebook agora ou vou ficar te ligando até amanhã cedo". Ela manda a senha e um palavrão. Acesso. Vamos ver. Eu preciso saber. Eu preciso. Então vejo que ele não posta nada há cinco semanas. Fotos, fotos. A única foto nova é o flyer de uma festa que eu fui e ele não estava. Nada.
Jogo o nome dele no Google. Aparece uma foto dele alcoolizado dando entrevista em uma festa de mídia. Como é lindo. Tento o Twitter mas ele só escreve piada de político. Tento o Facebook, Twitter e blogs de amigos. Está ficando tarde. Se eu tivesse essa mesma concentração e minuciosidade e empenho e energia para o trabalho estaria rica. Estou retesadamente motivada e atenta. Mas não consegui nenhuma informação e eu ainda preciso saber.
São seis da manhã. Estou cansada. Coloco a música de quando você forçou a porta do quarto e entrou. Black Swan. Não sou boa de inglês como você, mas sei que é a história de algo que já começou fodido porque cresceu demais antes da hora, você que pegue um trem e suma daqui. Que bela música pra começar. Ok, agora estou chorando. Lembrei que eu me sentia tão viva com você me olhando bem sério e bem no fundo dos olhos e machucando meu braço. Sim, é definitivamente uma recaída e eu acabo de decidir que te amo mais que tudo no universo e que amanhã, ou hoje, porque já são sete e meia da manhã, vou resolver isso. Agora preciso dormir só um pouquinho.
Volto pra cama. Coração disparado. Não tem posição na cama. O que eu faço? Não tô a fim de ler, não tô a fim de ver TV. Aquelas outras coisas que se faz pra acalmar tô com preguiça agora, minha imaginação está indo toda para traçar um plano para que eu descubra. Descubra o quê? Não sei, mas sei que algo está acontecendo, ou eu não estaria assim. Porque eu sinto quando ele está com alguém, sabe? Eu sinto. Sim! A cartomante!
Ligo pra Zuleide. Você atende hoje? Mas é domingo, Tati! Atende? Só se for por telefone. Tá bom, então joga aí: ele está com alguém? Mas Tati, você quer mesmo saber isso? Quero, mulher. Eu preciso saber. Joga aí: ele está com alguma puta? Tati, eu não posso perguntar isso pras cartas. Pergunta aí: ele tá com alguma piranhuda desgraçada vagabunda vaca dos infernos? Zuleide pede desculpas e desliga. Preciso do Lexapro mas ele acabou há semanas, igual meu amor. E agora, de repente, preciso tanto dos dois novamente.
Você acha que ele está com alguém? Não sei, Tati, eu ainda tô dormindo, posso te ligar mais tarde? Você acha que ele está com alguém? E se estiver, Tati, quer ir ao cinema mais tarde? Você acha que ele está com alguém? Putz, sei lá, homem sempre tá comendo alguém né? Você acha que ele está com alguém? Tati, do jeito que ele gostava de você? Claro que não!
Chega, chega. Preciso me acalmar. Pra que isso? Se ele estiver com alguém agora, e daí? Terminamos não terminamos? Ele e eu não temos nada a ver, certo? Decidimos que era melhor assim, certo? Eu não tava bem com ele e nem ele comigo, certo? Porque era bom e tal. Aliás, meu Deus, como era bom. Mas não era bom pra ficar junto, certo? Então pronto. Chega. Adulta, adulta. Qual o problema se ele estiver agora, justamente agora, lambendo a virilhazinha de alguma desgraçada? Qual o problema? Ok, eu posso morrer. Eu definitivamente posso morrer. Chega, vou acabar com essa palhaçada agora mesmo.
Tomo banho, me visto, pego a bolsa, entro no carro. Considerando que ele não mora em São Paulo, não sei exatamente o que eu pretendo com isso. Mas me faz bem enganar o cérebro e fazer de conta que estou indo atrás da verdade. Na verdade vou só na casa de outro, preciso fazer qualquer coisa que não seja sofrer, mas não consigo. O outro não conhece Black Swan, não ri da história da Zuleide, não me aperta o braço.
Volto pra casa, destruída. Sinto tanto amor dentro de mim que posso explodir e bolhas de corações vermelhas atingiriam o Japão. Quase não consigo respirar. Chega, chega. Ligo pra ele. Ele não atende. Ligo de novo. Ele atende falando baixinho. Você está com alguém? Estou. Desligamos. Pronto, agora eu já sei. Depois de um final de semana inteiro de palpitacões, descargas de adrenalina, músicas, textos, amigos, danças, gritos, sensações, assuntos, choros, dores, vida. Agora eu já sei.
O que eu nunca vou saber é porque faço tudo isso comigo só porque tenho tanto pavor do tédio. Era só isso o que eu precisava saber.


BERNARDI, Tati

Como ser o cara legal da minha vida

Não pense que não notei seu empenho perspicaz para ser o cara legal da minha vida. Prova do meu reconhecimento é que vou dar um empurrãozinho no seu esforço com algumas dicas. E aproveite bem, não é todo dia que uma garota sabe mais ou menos o que quer da vida, e ainda se sujeita ao papel de astrolábio.

Sei que leu numa revista que a base de um relacionamento é a comunicação, e eu valorizo isso. Mas que droga é essa de me contar seu dia, isso de conversar no café da manhã e de vez em quando parar tudo pra lembrar que na infância você tinha intolerância à lactose e medo de caramujo? Não, não é bonitinho. Fique calado um pouco, calado demais, às vezes - pensar sobre o que você está pensando pode me manter bem ocupada, sabia? Aliás, se eu quiser uma filial do Repórter Esso gritando novidades sem parar nos meus ouvidos, telefono pra minha mãe.

Se você quiser ser o cara legal da minha vida, diminua o tempo com preliminares. Preciso de alguém me acenda e logo arme a barraca, e não de alguém que arme a barraca, acenda uma fogueira e acampe por ali um fim de semana inteiro. Não se preocupe tanto com meu prazer, assim você racionaliza a única coisa contrária à razão, que é o sexo. Seja mais cru e animal, não se preocupe em me fazer soltar a imaginação. De tanto fazer isso já imaginei 817 cores que ficariam melhor no teto acima da sua cama. Insista duzentas vezes em me ensinar como calibrar pneus. Ache desperdício gastar 50 mil numa festa de casamento que dure apenas um dia. No auge da minha raiva, me tasque beijos.

Me deixe falando sozinha quando eu merecer. Demonstre cada dia ser mais apaixonado pelo seu trabalho chato do que por mim. Olhe pra alguma outra bunda do restaurante bem na hora que estou confessando planos para o futuro. Traga seus amigos pra uma sessão tripla de Quentin Tarantino enquanto preciso estudar pra minha prova de Política Social e Direitos Humanos. Ouça jazz e Frank Zappa. Use calça jeans e camiseta branca com mancha de maionese na frente das minhas amigas. Me leve ao parque de diversões e insista que o carro-choque é o melhor. Durma tranquilamente feito um fóssil depois de uma discussão séria. Me dê motivos, costumo reclamar da vida quando não tenho do que reclamar.

Se você quiser ser o cara legal da minha vida, receba torpedos de uma tal Bruna de outros verões. Ria alto e espalhafatoso no escuro do cinema com caretas bobas do Jim Carrey. Em parceria com meu pai, deboche do meu bicho geográfico no pé. Escreva um bilhete de aniversário de namoro e mande no dia errado. Às vezes me faça sair chorando da sua casa no meio da noite e me deixe com uma louca vontade de voltar pedindo pra nunca mais fazer isso comigo. Adicione vacas com cabelo comprido e liso no Facebook. Troque o canal para ASA de Arapiraca versus Atlético Goianiense no intervalo da minha novela. Afirme que o roteiro de "Ps, Eu Te Amo" é inviável na vida real. Esqueça a chave de casa em algum lugar que não sei onde é.

Pode parecer um pouco freudista, mas de vez em quando pareça meu pai me berrando pra calçar os chinelos, me faça parecer mãe quando você pegar uma amigdalite. Me force a pedir carinho e atenção. Esqueça de ligar duas noites seguidas, seja ríspido se eu te ligar. Faça mil besteiras, peça mil desculpas, faça mais sexos de reconciliação, diga me amar no meio. Odeie tofu, não se olhe no espelho de perfil, corte o cabelo no barbeiro da esquina, me deixe esperando. Erre tentando acertar, acerte tentando errar. Se você quiser ser o cara legal da minha vida, faça tudo isso, mas sempre jurando que foi sem querer. Mãos à obra, porque, pra ser o cara legal da minha vida, você ainda tem muito o que piorar.





NUNES, Gabito

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Sugestões para atravessar agosto

Para atravessar agosto é preciso antes de mais nada paciência e fé. Paciência para cruzar os dias sem se deixar esmagar por eles, mesmo que nada aconteça de mau; fé para estar seguro, o tempo todo, que chegará setembro- e também certa não-fé, para não ligar a mínima às negras lendas deste mês de cachorro louco.É preciso quem sabe ficar-se distraído, inconsciente de que é agosto, e só lembrar disso no momento de, por exemplo, assinar um cheque e precisar da data. 

Para atravessar agosto também é necessário reaprender a dormir, dormir muito, com gosto, sem comprimidos, de preferência também sem sonhos. São incontroláveis os sonhos de agosto: se bons, deixam a vontade impossível de morar neles, se maus, fica a suspeita de sinistros augúrios e premonições. Armazenar víveres, como às vésperas de um furacão anunciado, mas víveres espirituais, intelectuais, e sem muito critério de qualidade. Muitos vídeos de chanchadas da Atlântida a Bergman; muitos CDs, de Mozart a Sula Miranda; muitos livros, de Nietzche a Sidney Sheldon. Controle remoto na mão e dezenas de canais a cabo ajudam bem: qualquer problema , real ou não, dê um zap na telinha e filosoficamente considere, vagamente onipotente, que isso também passará. Zaps mentais, emocionais, psicológicos, não só eletrônicos, são fundamentais para atravessar agostos. Claro que falo em agostos burgueses, de médio ou alto poder aquisitivo. Não me critiquem por isso, angústias agostianas são mesmo coisa de gente assim, meio fresca que nem nós. Para quem toma trem de subúrbio às cinco da manhã todo dia, pouca diferença faz abril, dezembro ou, justamente, agosto. Angústia agostiana é coisa cultural, sim. E econômica. Mas pobres ou ricos, há conselhos - ou precauções - úteis a todos. 

Para atravessar agosto ter um amor seria importante, mas se você não conseguiu, se a vida não deu, ou ele partiu sem o menor pudor, invente um. Pode ser Natália Lage, Antonio Banderas, Sharon Stone, Robocop, o carteiro, a caixa do banco, o seu dentista. Remoto ou acessível, que você possa pensar nesse amor nas noites de agosto, viajar por ilhas do Pacífico Sul, Grécia, Cancún ou Miami, ao gosto do freguês. Que se possa sonhar, isso é que conta, com mãos dadas, suspiros, juras, projetos, abraços no convés à lua cheia, brilhos na costa ao longe. E beijos, muitos. Bem molhados. Não lembrar dos que se foram, não desejar o que não se tem e talvez nem se terá, não discutir, nem vingar-se , e temperar tudo isso com chás, de preferência ingleses, cristais de gengibre, gotas de codeína, se a barra pesar, vinhos, conhaques-tudo isso ajuda a atravessar agosto. 

Controlar o excesso de informações para que as desgraças sociais ou pessoais não dêem a impressão de serem maiores do que são. Aprender decoração, jardinagem, ikebana, a arte das bandejas de asas de borboletas - coisas assim são eficientíssimas, pouco me importa ser acusado de alienação. É isso mesmo, evasão, escapismos explícitos. Mas para atravessar agosto, pensei agora, é preciso principalmente não se deter de mais no tema. Mudar de assunto, digitar rápido o ponto final, sinto muito, perdoe o mau jeito, assim, veja, bruto e seco:.

ABREU, Caio F.